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sexta-feira, 25 de abril de 2014

Prisão, onde está a tua vitória? – Huey P. Newton


Prisão, onde está a tua vitória? – Huey P. Newton
                Quando se estuda matemática, aprende-se que há numerosas leis matemáticas que determinam o caminho a adotar quando se quer resolver os problemas que nos põem. No estudo da geometria, uma das primeiras leis a ser ensinada é a seguinte: “o total nunca excede a soma das partes”. Isto significa que não podemos ter uma figura geométrica, por exemplo, um círculo ou um quadrado, que contenha, na sua totalidade, mais elementos do que quando estava dividida em partes. Assim, se a soma de todas as partes representa uma determinada quantidade, a figura inteira não pode representar uma quantidade mais importante. A prisão nunca pode vencer um prisioneiro, porque os que dirigem tem um ponto de vista idêntico e supõem que, se possuem o corpo de um prisioneiro fechado na cela, possuem  também aquilo que faz dele um ser humano. Mas um prisioneiro não é uma figura geométrica, e o que em matemática é correto falha totalmente quando aplicado aos homens.
                No caso do homem, não podemos cingir-nos a um simples individuo, temos igualmente que considerar as ideias e as convicções que os motivaram e que o  apoia, mesmo quando seu corpo está preso. No caso da humanidade, o todo é muito maior do que a soma das partes, por que o todo comporta não só o corpo quase pode medir e aprisionar, mas também as ideias que não podem ser medidas nem aprisionadas. As ideias não estão só na cabeça do prisioneiro, onde não se podem ver nem controlar, as ideias estão também na cabeça das massas onde igualmente não podem ser vistas nem controladas.  As ideias que podem apoiar e realmente apoiam o nosso movimento pela libertação total e pela dignidade do povo não podem se aprisionadas, pois estão no povo, em todas as pessoas, onde quer que estejam. Enquanto o povo viver com os ideais de libertação e de dignidade no pensamento, nenhuma prisão poderá conter o nosso movimento. As ideias passam de pessoa para pessoa entre os nossos irmãos e irmãs que sabem que um dos mais diabólicos sistemas, o sistema capitalista, nos lançou uns contra os outros, quando afinal o único inimigo é o explorador que se aproveita da nossa miséria. Quando nos compenetramos desta ideia, começamos a amar e a apreciar os nossos irmãos e irmãs que antes considerávamos inimigos; e esses exploradores, que considerávamos amigos, aparecem-nos, então, tal como na realidade são e agem face aos oprimidos.
                A prisão funciona segundo este principio: “quando se dispões do corpo de alguém, dispõe-se de tudo, possui-se tudo... porque o todo não pode ser maior do que as partes”. Atiram com o corpo para uma cela, e isso lhes basta para se sentirem seguros e aliviados. A ideia de que a prisão permite vencer é, portanto, a seguinte: quando um indivíduo começa a pensar e a agir como lhe é ordenado, então eles ganharam a batalha e diz-se que o individuo em questão está “reabilitado”. Mas isto nunca sucede – pois os carcereiros não souberam examinar atentamente a sua própria ideologia e não conseguem compreender o gênero de pessoas que tentam manipular. Consequentemente, nem quando a prisão pensa ter alcançado  uma vitoria, essa vitoria existe.
                Há duas espécies de prisioneiros. A maioria é formada por aqueles que aceitaram a legitimidade das hipóteses sobre as quais se baseia a sociedade. Querem ter as mesmas ambições dos outros: dinheiro, poder, avareza e os gritantes sinais externos da riqueza. Para conseguir empregam, no entanto, métodos e técnicas que a sociedade definiu como ilegítimos. Quando estas pessoas são descobertas, são presas. Podemos chamar-lhes “capitalistas-ilegitimos” pois que seu objetivo é adquirir tudo o que a sociedade capitalista definiu como sendo legitimo. A segunda espécie de prisioneiro é comporta por aqueles que rejeitaram a legitimidade das hipóteses sobre as quais a sociedade se funda. São aqueles que afirmam que as pessoas do escalão mais baixo da sociedade são exploradas em proveito dos que se encontram no cume da escala social. Existem, portanto, oprimidos que serão sempre utilizados pelos opressores para manter o seu estatus de privilegiado. Não há nada de sagrado, nada de digno em explorar ou em ser explorado. Embora este sistema possa permitir a essa sociedade um alto nível de eficácia técnica, nem por isso deixa de ser um sistema ilegítimo, dado que se funda no sofrimento de homens que são tão preciosos e dignos de respeito como os que não sofrem. Assim, o prisioneiro da segunda categoria afirma que a sociedade é corrupta, ilegítima e deve, por isso, ser destruída. Este segundo tipo de prisioneiro é o prisioneiro político. Não aceita os argumentos da sociedade e não pode participar no seu sistema de exploração corrupta, esteja preso ou em liberdade.
                A prisão não pode vencer nenhum destes dois tipos de prisioneiros por maiores esforços que faça. O “capitalista-ilegitimo” apercebe-se de que se cumprir as regras do jogo que o sistema prisional lhe impõe conseguirá uma comutação de pena e sairá para continuar as suas atividades. Assim, está de acordo, concorda em aceitar as regras da prisão e “canta a musica que o carcereiro quer que ele cante”. O carcereiro pensa que ele está reabilitado e apto a poder sair para retomar a vida em sociedade. O prisioneiro, na realidade, fez o jogo da prisão para poder sair a fim de retomar o caminho de realização das suas ambições capitalistas. Desde o principio não há qualquer vitoria porque o prisioneiro sempre aceitou a ideia de base da sociedade. Ele finge aceitar a ideia de prisão como um dos avatares do jogo que sempre jogou.
                A prisão não pode vencer o prisioneiro político, porque não há nada de que (ou para que) ela o possa “reabilitar”. Recusa-se a aceitar os argumentos do sistema e recusa-se, mesmo, a participar nele. Participar significa admitir que a sociedade procede corretamente ao explorar os oprimidos. É esta a ideia que o prisioneiro político rejeita, foi pela sua oposição a ela que ele foi metido na prisão, e é por isso que ele não pode cooperar com o sistema. O prisioneiro político cumprira realmente a sua pena tal como o “capitalista-ilegitimo”. No entanto, o ideal que motiva e apoia o prisioneiro político radica-se no povo, e a prisão não dispõe nunca senão de seu corpo.
                A dignidade e a beleza do homem residem no espírito humano que faz dele algo mais do que um mero ser físico. Este espírito nunca deve ser suprimido para servir a exploração e outrem. Enquanto o povo tiver consciência da beleza do espírito humano e souber revoltar-se contra a destruição e a exploração, estará a por em pratica o mais alto ideal de todos os tempos. O todo humano é muito maior que a soma das partes que o compõem. O ideal estará sempre no seio do povo. A prisão nunca poderá vencer porque as muralhas, as grades, cós carcereiros não poderão jamais vencer ou conter a ideia de liberdade.
TODO PODER AO POVO
                Heuey P. Newton
Ministro da Defesa do Partido dos Panteras Negras.

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