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terça-feira, 1 de agosto de 2017

Rafael Braga e a Esquerda Brasileira.


Ontem, 31 de julho, aconteceram em algumas cidades do país atos/vigílias pela liberdade de Rafael Braga. A mobilização teve como intenção pressionar politicamente o Judiciário para que o pedido de habeas corpus fosse concedido ao jovem negro, no julgamento realizado hoje (1 de agosto), o que possibilitaria a ele responder seu processo em liberdade.
Em São Paulo, a manifestação se concentrou por volta das 18hs em frente ao Teatro Municipal caminhando pelas ruas da região central, exigindo a liberdade de Rafael Braga, o fim do encarceramento em massa e do genocídio da população negra e pobre. Esse ato foi organizado por setores do movimento negro que tem se articulado a partir de campanhas por Rafael Braga como, por exemplo, “30 dias por Rafael Braga”. O ato foi composto centralmente por setores negros independentes e setores do movimento negro, a participação da esquerda que se reivindica socialista foi irrisória. 
Nesse texto, gostaríamos de nos aprofundar nos elementos que levam a essa expressão tão pequena da esquerda numa luta tão importante e emblemática. Enquanto militantes negros revolucionários, acreditamos que só um balanço duro e sincero pode nos levar à construção de uma política verdadeiramente revolucionária que se funda às necessidades e a luta dos negros em nosso país. Enxergando o verdadeiro papel dos setores negros na vanguarda da classe operária assim como a importância da luta negra independente.
Rafael Braga, hoje se coloca como o único preso político de um período reivindicado pela esquerda como o marco de uma mudança na conjuntura política do país. Fruto dos grandes levantes populares, foi uma escolha política quase perfeita da burguesia racista.
A prisão desse jovem significa uma clara demarcação da resposta que as classes dominantes e o Estado brasileiro preparam para o momento de ascensão da luta operária e popular. Ela não vem sozinha, vem com iniciativas como a da redução da maioridade penal, a retomada de discussões como as leis anti-terroristas, as UPPs, a militarização das favelas, morros e periferias, assim como um processo de aprofundamento das políticas higienistas e manicomiais em várias capitais. Um claro ataque racista.
Milhares de jovens negros são presos cotidianamente a partir da política de Estado de encarceramento em massa, além destes, outros milhares são mortos a partir da política genocida desse mesmo Estado. O que diferencia Rafael destes jovens é o fato dele ter sido preso pela acusação de um crime de “terrorismo” (suposto porte de artefatos explosivos). Essa relação por um lado torna esse jovem um preso político das manifestações contra a Copa do Mundo, por outro, impõe a reflexão para os movimentos sociais e as organizações de esquerda sobre a questão carcerária, a violência policial e os demais problemas enfrentados cotidianamente pelos negros.
Esse caso deve ser visto como uma tentativa de estabelecer antecedentes na consciência coletiva que permitam que outros ataques sejam desferidos no conjunto dos trabalhadores e centralmente nos setores mais oprimidos e explorados, os negros e negras. Esse processo se alicerça na ideologia hegemônica racista na qual a prisão de um homem negro é naturalizada, pois se trata de um setor visto como “suspeito”. 
Ao articular a sua trama racista o Judiciário e o braço armado do Estado não para por ai, para sustentar a criminalização desse jovem, como símbolo da criminalização dos movimentos sociais e da luta, a polícia relacionou a sua prisão primeiramente à “ações terroristas”. Isso se deu no momento político em que setores mais conservadores se colocavam contra as alas mais radicalizadas dos protestos, denominadas “baderneiros”. 
O caso, assim como a luta pela liberdade de Rafael repercutiu nacionalmente, influenciando setores da opinião pública e contestando toda a teoria da polícia. A prisão de um jovem negro por portar produtos de limpeza desmoralizou a ação dos juízes e da polícia, ao mesmo tempo abriu espaço para a discussão da criminalização dos setores pobres e negros da população.
A partir dessa desmoralização, foi preciso ir mais longe, ligando Rafael ao tráfico de drogas. Nesse momento, mais uma vez, a “guerra às drogas” mostra a sua verdadeira face racista. São os jovens negros, pobres e periféricos as maiores vítimas de um massacre em nome de um falso combate às drogas. Num país estruturalmente racista a prisão de um jovem negro por tráfico de drogas é naturalizada. É a partir dessa política que a repressão tenta transformar Rafael, um preso político em um “criminoso comum”.
E como se comporta a esquerda a partir dessa realidade?
Os setores da esquerda socialista têm levado a campanha pela liberdade de Rafael Braga, quando muito, como uma simples tarefa corriqueira. Assim, como trata o conjunto das pautas e demandas essencialmente negras, a defesa de Rafael aparece como uma categoria de segunda importância.
A origem desse racismo é profunda e antiga, retoma aos primórdios da construção das organizações de esquerda no país. E pode ser vista a partir do papel reacionário de se colocar contra as demandas negras, que cumpriu o Partido Comunista, virando as costas para os negros, restando como “única opção” de aliança o integralismo.
 O que hoje nos salta aos olhos, é uma clara adaptação à tese racista do Mito da Democracia Racial, por via da qual os elementos raciais são negados e excluídos, formando uma análise “sem raça” da realidade, o que leva a fortificação do racismo entre as fileiras ditas revolucionárias e ao afastamento dos setores negros que desejam lutar pela transformação da realidade.
Como militantes revolucionários, fazemos coro com os irmãos e camaradas negros que nos antecederam e que provaram que a questão de raça e classe são um par dialético inseparável. Isso, pela negativa, pode ser comprovado a partir da defesa envergonhada que esses setores (esquerda socialista) têm feito de Rafael Braga. Nela o racismo se mistura a uma política “inconsequente” que deixa para traz os presos políticos. Deixando também um rastro sombrio para o futuro da luta de classes e da luta por uma vida digna da população negra.
Poderia ser diferente.
Hoje, apesar de muito pequena a esquerda socialista possue certa influência em setores da classe operária e também de movimentos sociais. É responsabilidade do conjunto dos lutadores se colocar na defesa incondicional da liberdade de Rafael Braga. Para isso seria preciso que os partidos e as organizações de esquerda levantassem campanhas reais e de base que organizassem os trabalhadores, juventude e etc. para lutarem com as ferramentas construídas historicamente pelos trabalhadores por seus presos políticos.
A partir de atos, greves, paralisações, piquetes e etc. seria possível impor essa derrota à classe dominante, moralizando os que lutam e construindo junto ao movimento negro e aos negros que desejam se levantar contra o racismo uma perspectiva militante onde a esquerda revolucionária se torna um forte aliado. 
A partir de nossas pequenas forças, panfletamos e discutimos com trabalhadores em fábricas sobre a necessidade de que a paralisação de 30 de junho levasse enquanto exigência dos trabalhadores do país a Liberdade imediata de Rafael Braga. Essa pequena ação é uma expressão, fruto de nossos balanços, de como acreditamos que os revolucionários devem atuar.
A relação entre raça e classe não pode ser apenas tema de falas calorosas em dias de “calendário de luta”. Se trata da validade, da vitalidade e da justeza de uma saída revolucionária em nosso país. Quando falamos que a revolução será negra ou não será, estamos também dizendo que uma organização que não é capaz de pensar a questão negra no país, que não dê provas concretas de que é capaz de avançar em direção aos setores mais oprimidos da classe trabalhadora está na contramão da construção de um partido revolucionário no Brasil. Seu destino é continuar sendo composta por pequenos grupos brancos de classe média. Um caminho certo para o fracasso.

Ass. Marcela de Palmares, Nat Zhamora e Fábio Nunes.

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